segunda-feira, 13 de setembro de 2010

A Bíblia e a Igreja - Texto da Igreja Ortodoxa


A Bíblia e a Igreja

Artigo traduzido por Raimundo Santos
Original em inglês: Orthodox Research Institute The Bible and the Church

Existem, hoje, mais de 250 denominações se proclamando Cristãs e se apegando à Bíblia Sagrada como a única fonte de fé. Invariavelmente, elas defendem que as Escrituras contenham toda a Revelação de Deus ao homem, e tudo o que é essencial à salvação humana esteja somente nelas. O Espírito Santo, dizem eles, guia cada leitor sincero das Escrituras a um próprio entendimento delas; não é necessário buscar auxílio e interpretação de nenhuma outra fonte, tais como a tradição da Igreja.


Qual é a reação Ortodoxa a isto? Para responder, devemos nos fazer algumas perguntas básicas: “O que são as Escrituras?”, Como os primeiros Cristãos lidavam com elas?”

“O que a Bíblia diz sobre ela mesma?”.

Todos os Cristãos aceitam a Bíblia como a palavra inspirada de Deus. Mas muitos não compreendem que a Bíblia, como a conhecemos hoje, é produto da Igreja, respondendo a certas condições e situações no Cristianismo Primitivo sobre a consciência profunda da verdade de Cristo.

Os diversos livros que compõem o Novo Testamento são o que poderíamos chamar de “escritos ocasionais.” Eles foram escritos para momentos e propósitos particulares, dirigidos à comunidade e grupos em particular. Por exemplo, São Mateus escreveu um breve relato do Evangelho que ele pregou para beneficiar especialmente os judeus falantes do aramaico. As epístolas de São Paulo confrontaram problemas especiais que ele tinha de resolver ou abusos que ele tinha de corrigir. Não havia nenhuma intenção ou esforço por parte dos escritores das Escrituras de compor um livro chamado “Novo Testamento.” Eles escreveram para esclarecer, resolver disputas, corrigir erros, e lembrar os Cristãos do legado deixado a eles por Cristo.

Por muitos anos, inúmeros escritos circulavam livremente entre as igrejas. Além do que aceitamos hoje como o cânon das Escrituras, assim como outros livros que compunham a palavra inspirada de Deus, havia pelo menos cinquenta “evangelhos”, uns vinte e dois conjuntos de “atos” e inúmeras epístolas e livros de revelações. Por algum tempo, alguns desses escritos eram lidos nas igrejas junto com as epístolas de São Paulo. De todos os escritos em circulação, foi a Igreja quem finalmente julgou o que era e o que não era autêntico e inspirado. A coletânea desses livros inspirados veio a ser conhecida como Novo Testamento e, junto com o Antigo Testamento dos judeus, compuseram a revelação escrita de Deus à Sua criação. O Segundo conjunto de escritos foi o cumprimento do primeiro, onde no Antigo Testamento as profecias apontavam para o Messias, no Novo Testamento, Cristo, Ele próprio, apareceu como a culminação da revelação de Deus.

Mas as perguntas continuam: Como poderia a Igreja discernir entre o que era a verdadeira Escritura da que não era? A resposta é encontrada no fato de que a Bíblia não foi o ponto inicial da fé Cristã, mas um resumo dela. A bíblia não é toda a revelação, mas parte dela. Ela não é o fundamento da Igreja, mas seu produto. A Igreja precedeu a Bíblia; De fato, seria difícil explicar a existência de Cristãos nos primeiros anos após o ministério e Ressurreição de Nosso Senhor se, como muito Cristãos modernos insistem, as Escrituras fossem o fundamento da fé! Conforme o Padre Alexander Turner explica, antes que as primeiras epístolas de São Paulo fossem escritas, a igreja Cristã já estivera estabelecida e em plena atividade por duas décadas, estando organizados seus sacramentos.

Se a Igreja aprovou e colocou seu selo de aprovação no que agora é a Bíblia, não foi porque ela foi presunçosa, mas porque ela foi testemunha da promessa de Nosso Senhor de que o Espírito Santo a guiaria na plena verdade. E por causa deste direcionamento, somente a Igreja pode dizer, com certeza, que compreende as Escrituras. Somente a Igreja pode proclamar na sua plenitude a “fé de uma vez por todas depositada nos santos” (São Judas 3).

É difícil acreditar que Deus não possibilitasse uma composição imediata e a vasta distribuição do Novo Testamento se este fosse considerado como a fonte necessária para a salvação humana. Mas o fato é que não somente os primeiros Cristãos não tinham os Evangelhos escritos, como também até à invenção da prensa em meados do século XV – pelo menos 1.400 anos após a morte de Cristo – as Escrituras estivessem disponíveis somente para os mais ricos. Em valores atuais, o custo de uma única bíblia antes do uso da prensa seria estimado bem acima de mil dólares. Como poderíamos explicar os milhões de Cristãos que viveram e morreram antes que o Novo Testamento fosse completado? Certamente que eles não foram Cristãos bíblicos. Entretanto, milhares e milhares deles deram suas vidas em martírio, testemunhando um Cristo que era tão real para eles como Ele é real para nós hoje – até mais real do que para nós – e para quem a devoção deles é inigualável nos anais da história.

Estes Cristãos aprenderam sobre Cristo através dos ensinamentos da Igreja, através da rica e viva tradição da Igreja, de geração em geração, até o presente, pura e intacta sob a inspiração do Espírito Santo.

Certamente que os livros do Novo Testamento foram aceitos calorosamente pelos Cristãos quando foram escritos e apresentados nas igrejas, e nenhuma igreja presta mais honra e veneração a estes escritos do que a Ortodoxa. Mas eles viam neles não uma nova religião, não um novo Cristo, mas uma reflexão da religião que há muito tempo eles haviam praticado, e um Cristo que eles há muito tempo tinham conhecido e amado.

Foi pela pregação e não pela palavra escrita que as nações foram convertidas a Cristo. São João Crisóstomo escreveu que “Cristo não deixou nenhuma instrução escrita a Seus Apóstolos; mas ao contrário, Ele prometeu a eles que o Espírito Santo os inspiraria com o que eles deveriam dizer.” Os Apóstolos e seus sucessores deram ao mundo o Cristianismo, não distribuindo Bíblias gratuitamente, mas pregando com autoridade dada a eles por Cristo: “Vão, e assim, façam discípulos das nações”.

As próprias Escrituras exortam os Cristãos a guardarem a fé transmitida tanto por palavra quanto por carta. Quando São Paulo pregou aos Tessalonicenses, ele instruiu-os... “Guardai os ensinamentos que aprenderam, quer por palavra ou por carta nossa” (II Tess, 2:15). Nenhuma distinção era feita entre a tradição oral e a tradição escrita, nenhuma escala de valor foi determinada em que as Escrituras fossem colocadas acima da palavra oral. São Paulo buscou comunicar aos Cristãos de seu tempo a plena revelação de Deus – tanto escrita quanto não-escrita – qualquer outra coisa teria sido contrária ao espírito de somente a Bíblia. Pois a plenitude da revelação está na Igreja, que é o Corpo de Cristo, e não é descoberta através da interpretação pessoal. Pois nunca, “nenhuma profecia foi revelada por vontade humana: mas homens santos de Deus falaram quando eram movidos pelo Espírito Santo.” (II Pedro, 1:20-21).

Eis a questão: quem conhece mais o Cristianismo? Os Primeiros Cristãos que provaram do martírio por amor a Cristo, aqueles que conheceram os Apóstolos e aqueles que por eles foram ordenados, ou os Cristãos que, séculos mais tarde, decidiram apagar 1500 anos de tradição, desprezando essa antiga e primitiva fé Cristã?

Separar a Bíblia da Igreja é extirpá-la de seu contexto e abrir uma porta à confusão e á mentira. Quando alguém escolhe aceitar a Cristo, deve também aceitar as plenas implicações de Seus ensinamentos, a plenitude da fé Cristã. Não podemos ter a Bíblia e rejeitar a Igreja, da mesma forma que não podemos ter a Igreja e rejeitar a Bíblia. Juntas, elas formam uma tradição infindável, enraizada em Cristo.



Artigo traduzido por Raimundo Santos
Original em inglês: Orthodox Reseach Institute






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